domingo, 23 de março de 2014

SANTUÁRIO DE BOROMA






As missões  cristãs foram  por muitas dezenas de anos as únicas instituições de ensino  em Africa e particularmente  no seu interior. 
A poucos quilómetros  da vetusta cidade de Tete fica uma dessas missões. Talvez das mais  proeminentes  em acção numa zona rica de história, a Missão de Boroma , á data era assim definida:

"Esta missão, fundada lia poucos annos pelos padres jesuítas da Zambezia, está situada no prazo Boroma, na margem direita do Zambeze, e quatro horas a montante de Tete, na base da serra Nhacindi, c na margem esquerda do riacho I\Iutatazi. O logar é extremamente pittoresco, de alegre e formoso aspecto, assenta cm terrenos férteis, c junto a abundantes pedreiras de jaspe de que se faz óptima cal.
As casas de habitação, igreja, escolas, dormitórios, celleiros c outras officinas tinham, ainda em 18S8, um aspecto um tanto provisório, mas estavam n"um irreprehensivel estado de ordem e asseio. Todas as edificações estão encerradas em um vasto quadrilátero de tapume de paus, similhando os das aringas, mas mais fraco do que ellas, e só destinado a impedir a approximação das feras, e difficultar a dos ladrões.

Visitei a missão em 22 de novembro de 188S, e fiquei agradavelmente impressionado com o resultado admirável já tirado pelos beneméritos padres e seus auxiliares, a despeito das invejas e malquerenças com que os tcem por vezes perseguido alguns moradores do districto. Não posso deixar passar esta occasião sem mencionar aqui os nomes dos heróicos e desinteressadissimos obreiros da civilisação, que tão respeitosa e amavelmente me receberam na missão de S. José de
Boroma, e que tanto teem já trabalhado. Eil-os : Victor José Courtois, superior da missão da Zambezia superior.”sic”


Muitos homens  aqui aprenderam as primeiras letras, aqui se formaram  profissionalmente  em diversas áreas. O complexo da seculo XIX  foi construído por moçambicanos, orientação jesuíta , permanece ainda com a traça que lhe dá tanta beleza .Uma relíquia em solo do interior.

Versus.1965(ignotus)

Se um dia fores a Tete…
reza uma prece em Boroma.


Ao romper da madrugada
enquando o  rio é sudário,
de grossas aluviões
Sobe  p´la  ondulante  picada
Até Boroma santuário
local de muitas reflexões


No nicho, á sua entrada,
Um grosso cirio acende
que dure a tua estada
de te lembrar tanta gente
que gostaria de pisar
essa terra mui sagrada

Poe ramos de rubras flores
das acácias… floridas,
nos altares p´los teus amores,
Pelas horas ali vividas
P´ra que ninguem sinta o sabor
da hora da despedida


se um dia fores a Tete..
reza uma prece em Boroma
                                              (Sent. 1965)

sexta-feira, 21 de março de 2014

A MACHAMBA DO MUFA

....era no Mufa que se encontrava a machamba mais visitada da rapaziada residente em Tete.Não sei se teria sido um"prazo"com aringa não há sinais de tal.  O lugar nada tinha de diferente de qualquer machamba de aldeia típica. Palhotas e barracão de tábuas pouco aparelhadas com telhado de folhas de zinco, alpendres de caniço,  enriqueciam o recinto as árvores com boas sombras. Então o que é que havia de extraordinário na Machamba do Mufa ?
Proprietário, dado ao cultivo, ali passava maior parte do tempo, após horário laboral e invariavelmente todos os fins de semana. Fornecia alguns comércios locais de verduras frescas. Reunia um grupo de trabalhadores de maioria feminina . Cozinhava  á moda de rancho da tropa e por ali havia sempre a cerveja fresca .
Tudo isto convidada os celibatários, os "casadões desenfiados" e os solitários a passarem, diferentemente acompanhados num convívio, sem preconceitos de raça ou classe social.Por vezes só para adultos. As ocorrências ficavam hermeticamente fechadas no segredo dos frequentadores. O petisco não faltava e os mais habituais sempre levavam alguma coisa para ajudar. As cervejas faziam-lhe sempre companhia e as que sobrassem ficavam na geladeira a petróleo para o próximo encontro.Quem entrasse no recinto a primeira impressão era de marcha a trás e regressar de onde veio.  Por menor aspecto que um lugar comporte, quando há uma palavra amiga, num dialogo de entretenimento, o cenário tem outro encanto.Era diferente do ambiente do ar condicionado dos cafés ou da sombra mais quente das esplanadas ,que se tornavam socialmente  frias, porque não havia alguém com quem conversar. Nem todos tinham o "privilégio " de frequentar a Machamba do Mufa. Era quase como um clube onde , se é convidado ou  apadrinhado. Muita gente , pelos meados dos anos sessenta a setenta, por ali passou muitos bons momentos . por ali também ficaram sementes que gerarem  em "terrenos" não agricolas. Os tempos davam aso a acontecimentos que a história não vai contar em livros , ficam nas páginas da enciclopédia da memoria. Os nomes que as pessoas têm, impostos pelas mães, por aqueles lados são o"ADN" de parte da a sua origem. .....Ir á machamba do mufa era passar um dia fora da monotonia da cidade e fugir dos passeio dos tristes.....

sábado, 8 de março de 2014

DO DIA À DIA EM TETE (ANOS 60/70)




......era uma cidade pequena, espraiada, valia-lhe a população dos arredores não urbanizados.Os militares que chegavam tinha como prioridade fazer um reconhecimento  sempre pormenorizadamente eficaz. Os bares eram de certeza rubricados pelo sua presença. 
Um dos que na altura tinha popularidade  era o Bar Melo. A hora  indicada para o petisco era pela tardinha, quando o sol  matizava o céu com suas cores únicas  que se reflectiam no rio, soberbo,por ser vestido por aquela maravilhosa cachoeira de cores.

Os passarinhos, fornecidos pelo João "Coxo" do Matundo,eram o principal petisco, cozinhados , exalavam um aroma de bem  condimentados. Faziam crescer  água na boca , abafada com uma manica fresca de palmo e meio(basuka) que acompanhava a mastigação com estalido  num.. "está de gritos". 
Frequentado por uma marioria operária, conferia-lhe o estatuto  de  bar do povo. Neste ambiente  gourmet-populi  era corrente a aposta da rodada . O ou os vencidos em jogada de matraquilhos pagavam. As vazias manicas ou laurentinas iam ocupando o balcão para uma correcta contabilização de factura. 
Mas no meio, destes convívios alcoólicas e jogos, aparece sempre um espertinho. Num belo anoitecer quando as partes estavam quites e o gourmet mais apurado, eis que apareceu, militar mitimba , nato e criado na Ribeira do Porto. Matraquilheiro afamado no seu bairro trazia na goela a prosa gabarola de invencivel. A palavra ia-se confirmando, em duas jogadas limpas e com estilo.E ,empoleirado no seu degrau de vencedor, riu-se  quando viu surgir uma moça- menina, magrinha e alta apoiada pelos já bem rodados." Mitimba"  acabou o liquido que lhe escorria pela goela abaixo sem lhe custar uma quinhenta e lá vai emproado para uma partida que seria de brincadeira.
Os vencidos que continuavam inchando a mimba, começaram cercar a mesa e a incentiva-la . Se   a menina perder nós, pagamos a rodada. Filha do dono do bar, Rosa, alem de praticar tinha uma intuição nata para aquele jogo. Com humildade e habilidade, que lhe era notória, desembaraçou-se da primeira partida com três ou quatro de avanço. "Mitimba" não se deu por vencido e quer a desforra. A apoio aplaude e catrapuz, abada completa.... Rosa nem o deixou respirar..... e aconselhada afastou-se......fica para a proxima........ mas acho que não houve próxima...

terça-feira, 4 de março de 2014

PELO DESVIO DO MAZOI

....  viajar até à Beira ou Harare, tetense tinha que primeiro adquirir boa disposição e estar devidamente "programado" para enfrentar a trepidação  da estrada.Antes do asfalto, as pontes começaram a nascer no seu devido lugar e altura. Não houve nenhuma com nascimento prematuro. A que pareceu ter dois períodos de gravidez foi a do Rio Mazoi. Ao lado para que o turista tivesse mais consciência da real natureza, colocaram um desvio. Desvio histórico e cheio de peripécias que dariam  grande reportagem para jornalista criativo e apaixonante Toda a gente era obrigado a conhecer o ...desvio do mazoi.... nem o rio encontraria o  Zambeze se não levasse a mensagem cheia de vernáculos de  étimo;-  latino e  nhungwe.  Provocador, oferecia ao motorista mcurros de diversas alturas e em estilo de ondulação  marítima . Pela chuva, divertia-se á brava, com o patinar no matope sedoso que só pau do mato ajudava o fim do festival . Passado o percurso de recreio, o turista , tinha a sua passagem ao longo da estrada, as aldeias típicas em cenários maravilhosas de arborização ou de machambas  de sobrevivência.Não faltava o adeus shamwari do mwana risonho, alegre que empurrava o carrinho de arame, cópia meticulosa de carro que por ali passasse 







Chegados á Changara deitava-se a quinhenta ao ar, na escolha de itinerário para a capital do Zimbabwe (então Rhodesia). Via  Machipanda  ou via Nyamapanda . Se pela primeira admirava toda a maravilha do planalto do Chimoio e Serra de Vumba pela segunda encontrava uma vida mais selvagem em caminho  mais curto. 
A moeda  deu a  face da segunda. Nos quilometros entre Changara e Nyamapanda, cruzava-se com os TIR que iam a caminho do Malawi. carregados de mercadorias. Eram várias as companhias que faziam essa ligação Harare/Blantyre e vice versa. Havia sempre uma saudação deixavando-nos mais seguros em caso de avaria. 
Animais selvagens também era comum avistarem-se e vez houve que tivemos que abrandar e lentamente afastarmos-nos dum bando de macacos (cães) que pacificamente faziam uma "manifestação" no meio do caminho deste mini safari.
 Atravessada a fronteira tudo mudava. As estradas asfaltadas, as bermas bem assinaladas com o capim cortado, aqui e acolá, um espaço onde se poderia parar e cuidarmos das nossas necessidades.











O primeiro burgo a nos receber era o Mutoko.





Uma city bem arrumada, comercial e interessante.  Atestava-se o deposito,refrescava-se pois ainda faltavam uns bons kilometros para chegarmos ao Harare (ex-Salisbury). Até lá admiravamos as belas fazendas e as aldeias de casas que, já,caracterizavam a região. Hospedados na bela metrople capital da "suiça africana" esperava-nos uns dias de  civilização diferente............