sábado, 8 de outubro de 2011

DIA DE DOMINGO

 QUALQUER DOMINGO DE 1972


 Era domingo a cidade despertara cedo. Poucos eram os casais que se acompanhavam na missa. Ela, de vestido bem ajustado ao corpo, de tecido leve, a passar um pouco abaixo do joelho, coisas da moda, entrava na Igreja e procurava o lugar,o mais perto possível de conhecida, para ter ajuda no olhar crítico, ele de camisa branca, de casquinha de ovo, calças de linho , espreitava para ver onde a mulher ficara, cumprimentava em redor, e depressa se encaminhava para o café ao lado, onde, habitualmente, um grupo tinha mesa reservada.


Á porta do S.Tiago o movimento era outro, bem diferente.. saris de cores variadas, davam, naquela manhã, um tom festivo á entrada para filme indiano, que o cartaz indicava como um drama de amor. Fiel assistente a essas longas matinées, por vezes perdia-me no encanto dos saris e num lindo rosto moreno, acetinado e jovem, de longos cabelos negros e brilhantes , há quem os gostasse mais de ver em longa trança .. para mim soltos, meio cobertos, tinham outra graça ...Sessões houve que passava a hora do almoço e o desenlace do drama amoroso por acabar..


Na sessão da tarde respirava-se outro ambiente. Fosse qual fosse a fita, a juventude estava lá toda. Haviam lugares reservados ... ao apagar das luzes muitos mudavam de ocupante. Havia sempre desculpa para mudar de cadeira. Ali se encontravam os namoricos,onde não faltavam os beijinhos fugitivos, que por vezes se reafirmavam nos bailes dos clubes.


Quando os raios alaranjados do sol se espraiavam e o rio os acolhia num cenário arrebatador.. era hora do passeio. Corriam-se as montras á procura das novidades, pela rua Rafael Bivar, parava-se no meio, frente á Socote e dali o Valy Ossman, a Fersope, Tulcidás, Begas e outros; rua Freire de Andrade abaixo virava-se para Gen.Bettencourt estacionava-se frente ao ATCM (Automovel e Touring Clube de Moçambique)e espreitava-se o friso com a Zuid, Ouriversaria Mateus, Boutique Camelot da Teresa Batalha, Papelaria Lopes e o Christos Luscos.


Ao fim do dia rumava-se até ao aeroclube, enquanto nos resfescavamos, contemplavamos o sol a esconder-se, rodeado de inconfundiveis cores e sentiamo-nos uns privilegiados a admirar. A cidade não parara. Para alguns havia que escolher. Quem gostasse de cinema tinha três á escolha, o velho S.Tiago, o Estúdio 333, preferindo o ar condicionado. Para os amigos da natureza que de sentir o pulsar da noite, de leve brisa que subia o Zambeze, olhando o cruzeiro do Sul, que o luar quase que não deixava deslumbrar, optavam pelo Kudeca, ao ar livre virado ao rio era uma pérola da cidade morena de lábios doces.


Aos mais noctívagos não faltavam bares e o Maxime era o centro de atenções, provocando alguns escândalos na cidade... era outra época. O burgo começara-se a habituar e alguns dos mais críticos tornaram-se os mais frequentadores. Eram já muitos os divertimentos nocturnos a que voltaremos, quando nos debruçarmos sobre as quermesses e os bailes dos clubes.


O dia de domingo passou mas os amigos prolongavam-no pela noite , sentados ao fresco em serões de tertúlia de bem conversar.